Maior picareta da história criou país fictício, vendeu terras e morreu rico
Felipe van DeursenColunista de Nossa
01/12/2024 05h30
General Gregor MacGregor Imagem: The Print Collector/Getty Images
15º52'N, 84º41'O
Costa dos Mosquitos
Reserva da Biosfera do Rio Plátano, Gracias a Dios, Honduras
Em 1822, um guia de 355 páginas chamou a atenção de moradores de Londres e Edimburgo. "Esboço da Costa dos Mosquitos, Incluindo o Território de Poyais", escrito por um certo Thomas Strangeways, divulgava as maravilhas desse pedacinho idílico do Mar do Caribe, tentando atrair britânicos ousados o suficiente para explorá-lo.
Strangeways descrevia o local como uma terra saudável, procurada por colonos europeus atingidos por doenças tropicais. Nesse spa natural, com água cristalina e florestas exuberantes, a terra era tão fértil que um agricultor poderia ter três colheitas de milho por ano, sem abrir mão de plantar açúcar ou tabaco (produtos muito rentáveis) sem esforço.
Além de ficar rico e saudável, aquele que se mudasse para Poyais teria comida e diversão fartas. Em um dia era possível caçar e pescar o suficiente para alimentar a família por uma semana. A capital, St. Joseph, era uma aprazível cidade barroca à beira-mar, com belas mansões, teatro, ópera, uma grande catedral, palácio e, em breve, um bairro judaico.
O guia era dedicado a "Sua Alteza Gregor, cacique de Poyais", e Strangeways se descrevia como seu "mais devotado, humilde e obediente servo". O texto fazia questão de frisar, no prefácio, que as informações contidas nele são fidedignas:
"Neste empreendimento, ele [Strangeways] se esforçou, tanto quanto possível, para evitar fazer qualquer declaração que pudesse parecer duvidosa ou exagerada, especialmente para aqueles de seus leitores que não estão familiarizados com as circunstâncias que até agora retardaram a civilização nesse país até então negligenciado."
Só um detalhe. Poyais não existia. Era um país fictício. Até aí tudo bem, J.R.R. Tolkien criou o mapa da Terra Média antes mesmo de começar a escrever "O Senhor dos Anéis".
Mas a ideia não era fazer literatura, mas dinheiro em cima de pessoas desavisadas. O autor do guia, o tal Strangeways, era um pseudônimodo homem que criou todo o esquema: o próprio Gregor, "cacique de Poyais", príncipe dessa terra fantasiosa na América Central.
O Golpe de Poyais, como ficou conhecido, foi, possivelmente, a mais sofisticada e criativa picaretagem da história. Uma nação forjada na mente de um estelionatário com uma vida cheia de aventuras e altos e baixos dos dois lados do Atlântico. Conheça Gregor MacGregor, o homem que arruinou centenas de famílias e até ajudou a criar uma crise na então maior economia do mundo.
De excluído da elite britânica a capitão insubordinado
O escocês Gregor MacGregor pertencia a um clã que, nos séculos 17 e 18, fora proibido pelo rei, Jaime 6º, de usar o próprio nome. Na época, o catolicismo, religião do clã, era perseguido na Inglaterra e na Escócia.
O banimento já tinha caído anos antes de Gregor nascer, mas essa característica de "forasteiro da sociedade", de "outsider do sistema", lhe caiu bem, e ele a reforçou. Quando adulto, MacGregor diria a quem quisesse ouvir que era descendente direto de um sobrevivente da frustrada e traumática aventura escocesa de tentar colonizar o Istmo de Darién, no Panamá.
Já falei do caso aqui. Se você acompanha a coluna há um t… - Veja mais em https://www.uol.com.br/nossa/colunas/terra-a-vista/2024/12/01/maior-picareta-da-historia-criou-pais-ficticio-vendeu-terras-e-morreu-rico.htm?cmpid=copiaecola
De queridinho a desafeto de Simon Bolívar
O que seria a orla de Mosquito, onde seria localizado o porto do Rio Negro, do território de Poyais
Imagem: Thomas Strangeways
MacGregor estava interessado em uma série de conflitos distantes, mas diretamente ligados às Guerras Napoleônicas: a luta pela independência nas colônias da América Latina. Ele vendeu suas terras na Escócia e zarpou para a Venezuela, um dos países que, de olho no enfraquecimento da Espanha (invadida por Napoleão) e influenciado pelos ideais de liberdade que ganhavam força no Ocidente, travou sua própria guerra para se libertar.
A partir de 1812, MacGregor lutou ao lado de venezuelanos e colombianos, rapidamente virou general e… - Veja mais em https://www.uol.com.br/nossa/colunas/terra-a-vista/2024/12/01/maior-picareta-da-historia-criou-pais-ficticio-vendeu-terras-e-morreu-rico.htm?cmpid=copiaecola
De falso cacique a convidado de honra
Um dólar do Banco de Poyais Imagem: Domínio Público
Em 1820, o aventureiro escocês estava na costa da atual Honduras, em contato com o povo misquito - por isso a região acabou conhecida como Costa dos Mosquitos, e não por uma possível superpopulação de insetos. Descendentes de africanos escravizados náufragos e de indígenas da América Central, os mosquitos tinham algo em comum com os britânicos: detestavam os espanhóis
Vejamos. "Um ex-militar britânico, que passou mais de uma década lutando ao lado das maiores lideranças sul-americanas, recebeu um título nobiliárquico local e acabou governando um desses novos e desprezíveis países que estão surgindo?" Uai, pode ser.
Gregor e Josefa eram um pacote completo para ter à mesa nos jantares mais interessantes e nas festas mais extravagantes de Londres. O apelo exótico do casal excitava as imaginações inglesas. Diziam até que ele descendia de alguma realeza indígena.
De mentiroso e estelionatário
Carte de la Neustrie mostra as cidades fictícias de Sidon, Tyr, Asylum, Refugium, Eden e Sertoria
Imagem: Domínio Público
Mas MacGregor não voltou ao Reino Unido só para contar vantagem. Ele estava em Londres para acompanhar a coroação do rei George 4º e sondar possíveis interessados em imigrar para a jovem e amiga nação de Poyais. Mostrava às pessoas uma cópia de um documento oficial emitido pelo governo do país, que dizia que ele estava em missão oficial à procura de interessados em carreiras civis e militares naquela pequena e rica democracia, sedenta por talentos estrangeiros.
...MacGregor era muito mais ambicioso: ele inventou um país inteiro."
Ainda hoje, a área onde ficaria Poyais é inóspita e pouco habitada. Integra a Reserva da Biosfera do Rio Plátano, um patrimônio da Unesco no Caribe hondurenho ameaçado pelo desmatamento. Ao lado de duas reservas vizinhas, ele constitui a maior floresta da América Central.
Foi para lá, no meio da selva, que MacGregor convenceu centenas de pessoas a largar tudo o que tinham e que conheciam e começar uma vida nova.
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