sábado, 19 de março de 2022

 

Artigo: Propostas de ações na área do livro e leitura, Jéferson Assumção

“Quanto mais leitura há, mais imaginação e capacidade de decifração há em um povo”, escreve Assumção
 19/03/2022 14h07
Foto: Fernando Frazão/ Agência Brasil

"O livro livra, o livro protege, o livro abre possibilidades porque amplia repertórios", aponta Assumção


Nunca foi tão necessário falar sobre o livro no Brasil. Num momento em que o fascismo entranhado em parte expressiva da sociedade brasileira vem à tona mais uma vez e que um Brasil arcaico, de armas em punho, ameaça nosso futuro, o livro ressurge como instrumento e como símbolo, talvez o mais poderoso símbolo de educação e cultura contra a barbárie. O livro livra, o livro protege, o livro abre possibilidades porque amplia repertórios e aumenta nossa capacidade de respostas para as incitações de uma realidade tão complexa, desigual e injusta, como a brasileira. 
A cultura brasileira é rica em sua oralidade, em sua espontaneidade, em sua diversidade, mas ainda é pobre em sua dimensão escrita. Desenvolver a dimensão escrita da cultura brasileira precisa contar com essa oralidade, espontaneidade e diversidade”. Essas frases abrem o artigo “A Dimensão Cultural da Leitura”, assinado pelo ministro Gilberto Gil, no Plano Nacional do Livro e Leitura, e ainda diz muito sobre como devemos pensar uma política de livro e leitura para o Brasil, uma política de leitura que se mostre ampliadora da diversidade cultural brasileira em vez de tentar diminuí-la. Não precisamos mais nos aferrar a uma ideia europeia e iluminista do livro. Antropofagicamente, é preciso pensar em uma ilustração de outro tipo, vital e diversa, articulada fortemente com as riquezas culturais do Brasil e não como um cimento por cima de sua diversidade.

E por que o livro ainda é importante? Num mundo multimeios, como bem já disse Renato Janine Ribeiro, um meio fundamental e que não pode ser negligenciado, é o do livro. Seus longos encadeamentos lógicos e estéticos nos exigem uma atenção frequentemente sequestrada pelo mundo das redes sociais e da tecnologia em geral. O livro é ainda mais necessário no mundo atual, porque estabelece um tempo diferente do cotidiano, um recorte na realidade que nos permite e exige como leitores, decifradores de textos não só dos livros, mas do mundo.

E tudo é texto. Nada há fora dele, como escreveu Jacques Derrida, corroborando as ideias de seu compatriota Roland Barthes, para quem tudo é narrativa, inclusive a vida. Ocorre que no mundo, real e digital, impera a equiprobalidade e a entropia, tudo tem o mesmo valor. As informações estão no mundo, mas em ordens ainda bem mais provisórias que no texto escrito. Além disso, no mundo dos livros o texto só se torna texto quando lido, ou seja, quando as linhas horizontais de quem escreve se encontram com as verticais feitas pela leitura. Assim, o texto é, para Vilén Flusser, o tecido resultante da trama entre as linhas escritas e lidas. Não só no livro, é claro, mas não podemos negar que nos livros o texto se organiza de uma maneira encadeada e ainda mais exigente, de atenção, profundidade, tempo dedicado e absorvido.

O fato é que, por suas exigências, o livro é um instrumento fundamental para a leitura da complexidade do mundo complexo. O exigente mecanismo da leitura não apenas envolve, como desenvolve no leitor a capacidade de imaginar, o que significa criar nossas próprias imagens. O texto não nos traz tudo pronto. A sua precariedade tecnológica exige ainda mais ativação da imaginação para que os sons, as ideias e as imagens vivam a partir da página inerte e silenciosa à nossa frente. Trata-se de um esforço individualmente relevante e socialmente impactante. Quanto mais leitura há, mais imaginação e capacidade de decifração há em um povo.

Como tudo é linguagem e nada existe, para os seres humanos, fora dela, quem domina as suas complexas possibilidades domina também o mundo. Quem cria as narrativas e explora suas possibilidades, cria realidades vividas pelos outros, e isso porque nada existe que não tenha sido contado, inventado, criado, seja por milênios de tradições orais e escritas, seja pelas mais modernas linguagens, códigos, algoritmos. A escrita e a leitura criam. O desenvolvimento de seu uso, ampliador de repertórios, transformador, estético e político, é condição para transformações culturais.

O livro não é apenas um suporte, mas um símbolo. Muito em suas dimensões educacionais, mas fundamentalmente em sua dimensão cultural. Custamos a articular de maneira democrática e participativa uma ideia ampla e poderosa dessa dimensão cultural da leitura, consubstanciada no Plano Nacional do Livro, Leitura e Literatura, gestados nos governos Lula e Dilma.

Leitura e cultura digital

Com a dissolução de fronteiras entre as artes e os campos da comunicação e da cultura, via aumento da convergência tecnológica, há cada vez mais a percepção da narrativa e da literatura em geral presentes no cinema, nas artes sequenciais (quadrinhos e animações), nos jogos de vídeo e outros (como as aplicações de storytelling e técnicas da ficção ao marketing político e comercial). Essas são também áreas e artes sequenciais, que dependem em muito das técnicas e da capacidade de se contar uma história, montar sequências e cenas, de criar e aprofundar personagens, inventar e descrever cenários, dar dinâmica à narração, gerando interesse no público das artes, da cultura, da comunicação. Neste sentido, é preciso destacar a importância da escrita em uma política de livro e de leitura. Tanto é assim que a Lei 13.696 institui não apenas uma política da leitura, mas uma Política Nacional de Leitura e Escrita.

Neste sentido, é importante do ponto de vista cultural pensar o desenvolvimento da Escrita Criativa, estratégia amplamente utilizada em diversas universidades dos Estados Unidos, França, Portugal, México, Argentina e muitos outros, para desenvolver não apenas a escrita ficcional, mas o gosto e o interesse pela leitura. Isso porque ao se mostrar como se faz um conto, um romance, uma peça teatral apresenta-se a literatura desde um ponto de vista muito concreto e não apenas teórico e histórico.

À medida que as tecnologias evoluem e mesclam as plataformas e suportes das diferentes artes, precisamos pensar em como preparar gerações de brasileiros capazes de dominar narrativas em diferentes contextos de aplicação. Trata-se de algo de enorme importância, uma vez que as indústrias culturais vêm se desenvolvendo de maneira menos concentrada e concentradora e multiplicando suas oportunidades para quem domina a escrita não apenas funcionalmente, mas cultural e criativamente.

qualidade do cinema, dos quadrinhos, da música e do videogame depende da qualidade de sua escrita. O escritor é fundamental para um bom quadrinho, um bom jogo, uma boa música, um bom teatro etc, mas também para boas campanhas de comunicação, para a educação etc. O mergulho ou a densidade dessas áreas dependem de qualidades literárias. Hoje em dia não apenas é possível atravessar as fronteiras materiais que haviam sido erguidas na era industrial, como também se pode aproveitar o arejamento vindo das periferias e da profundidade da diversidade cultural, também – e muito especialmente – para a narrativa na literatura e outras artes. Principalmente no Brasil, país tão rico do ponto de vista de sua diversidade natural e cultural, cujas histórias ainda estão em sua enorme maioria por serem escritas.

Se a base da indústria cultural tradicional foi até o século XIX e boa parte do XX a economia do livro, hoje a base é uma economia da escrita criativa aplicada também a outros suportes, a começar pelo audiovisual. Nessa área, o escritor segue central mesmo que a ideia de escritor como aquele que “produz livros” se fragmente para além das fronteiras das páginas impressas e hoje se aplique a essas demais áreas. A literatura não está apenas nos livros e precisa ser vista como parte fundamental de uma economia da cultura na era pós-industrial, com seus imensos desafios e oportunidades.

O que devemos fazer?

– Implementar plenamente a Lei 13.696, que institui a Política Nacional de Leitura e Escrita, importante instrumento para a promoção do livro, da leitura, da escrita, da literatura e das bibliotecas de acesso público no Brasil.

– Recompor a institucionalidade do livro e da leitura no Brasil, com a recriação da Secretaria do Livro, Leitura e Literatura, no futuro MinC.

– Reimplementar o programa de Modernização de Bibliotecas, ajudando a criar uma geração de bibliotecas vivas, pequenos centros culturais modernos e atrativos para jovens, crianças e adultos, em diálogo com as diversas identidades culturais do País.

– Retomar e ampliar a rede de Pontos de Leitura, as bibliotecas comunitárias e projetos exitosos de bibliotecas rurais a partir do Arca das Letras.

– Fomentar a formação de mediadores, com o aumento dos recursos e da atuação, em todo o Brasil, do Programa Nacional de Incentivo à Leitura – Proler, da Fundação Biblioteca Nacional.

– Voltar a posicionar a literatura brasileira no exterior, com a retomada e o aumento das bolsas de tradução, pela Fundação Biblioteca Nacional (FBN). Retomar também o nível de participação nas feiras e eventos internacionais, posicionando no mundo a enorme, diversa e qualificada produção brasileira.

– Construir e modernizar nacionalmente as bibliotecas públicas municipais, como barreiras contra a barbárie e suas armas.

– Zerar o número de municípios brasileiros sem bibliotecas.

– Voltar a implementar, em todo o Brasil todo o exitoso projeto Agentes de Leitura, que promove a mediação cultural em populações e territórios mais necessitados.

– Gerar um ambiente de valorização social e cultural do livro, com a universalização do acesso à leitura e à escrita, e suas dimensões educacionais e culturais.

– Reconhecer a leitura e a escrita como direitos de cidadania e via para uma vida mais digna de acesso e potencialização de expressões simbólicas próprias.

– Fomentar as feiras de livro, festas literárias, saraus, slams, jornadas literárias e bienais em todo o país, fortalecendo um circuito ativo e diverso de eventos literários.

– Implementar, via Biblioteca Nacional, um programa nacional de circulação de escritores e escritoras brasileiras em todo o território.

– Desenvolver estratégias para o aumento da relação entre escrita, leitura e cultura digital. É preciso aproximar o mundo do livro do mundo digital, para que este momento único de fim de uma era analógica e início de uma era digital se nutra dos longos encadeamentos lógicos e estéticos dos livros.

– Capacitar para a formação de professores e estudantes leitores e escritores.

– Articular cultura e educação, desenvolvendo ações de leitura e de literatura, como a hora da leitura nas escolas, bem como fomentar a escrita criativa entre os estudantes e professores, como importante ponto de entrada para a leitura e o mundo da literatura. Isso é importante para gerar uma relação de intimidade criadora com a escrita. Constituir um ambiente criativo e expressivo ampliador da bibliodiversidade brasileira.

– Promover a escrita criativa como parte da economia criativa do País, uma vez que ela é um potente elemento de desenvolvimento econômico integrado ao design. O designer atua no espaço, desenhando desde uma caneta até um edifício. O escritor é um designer no tempo, gerando narrativas, discurso e o desenvolvimento das artes sequenciais, seja a literatura, propriamente, como o teatro, cinema, quadrinhos, games etc. Ver a escrita criativa como parte da economia criativa é importantíssimo para outro tipo de valorização da escrita, a da geração de bens econômicos, emprego e renda.

– Precisamos desenvolver no Brasil uma escrita criativa não apenas do ponto de vista norte-americano ou europeu, mas a partir das potencialidades brasileiras, portuguesas e africanas, em diversidades e convergências com outras áreas, num sentido articulado e colaborativo.

* Escritor, foi coordenador e diretor de Livro e leitura do Ministério da Cultura, secretário de Cultura de Canoas-RS e secretário adjunto de Cultura do Rio Grande do Sul.

quinta-feira, 17 de março de 2022

Qual a origem da expressão “mas será o Benedito”?

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Qual a origem da expressão “mas será o Benedito”?

 17 de março de 2022 1 comentário17 de



 Benedito Meia-Légua, o homem que assombrou os escravagistas anos antes da abolição. Conheça a história da expressão “mas será o Benedito”

Seu nome original era Benedito Caravelas e viveu até 1885, um líder nato e bastante viajado, conhecia muito do nordeste. Suas andanças conferira-lhe a alcunha de “Meia-légua”. Andava sempre com uma pequena imagem de São Benedito consigo, que ganhou um significado mágico depois.

 20Ele reunia grupos de negros insurgentes e botava o terror nos fazendeiros escravagistas da região, invadindo as Senzalas, libertando outros negros, saqueando e dando verdadeiros prejuízos aos racistas.

Contam que ele era um estrategista ousado e criativo, criava grupos pequenos para evitar grandes capturas e atacavam fazendas diferentes simultaneamente. A genialidade do plano era que o líder de cada grupo se vestia exatamente como ele.

Benedito reaparecia em outras rebeliões sempre o infortúnio de ser capturado lhe acontecia. Os fazendeiros passaram a crer que ele era Imortal. E sempre que haviam notícias de escravos se rebelando vinha a pergunta “Mas será o Benedito?

“O mito ganhou força após uma captura dramática. Benedito chegou a São Mateus (ES) amarrado pelo pescoço, sendo puxado por um capitão do mato montado a cavalo. Foi dado como morto e levado ao cemitério dos escravizados, na igreja de São Benedito.

Noutro dia, quando foram dar conta do corpo, ele havia sumido e apenas pegadas de sangue se esticavam no chão. Surgiu a lenda que ele era protegido pelo próprio São Benedito. Por mais de 40 anos ele e seu Quilombo, mais do que resistiram, golpearam o sistema escravocrata.

Meia-Légua só foi morto na sua velhice, manco e doente. Ele dormia em um tronco oco de árvore. Esconderijo que foi denunciado por um caçador. Seus perseguidores ficaram a espreita, esperando Benedito se recolher. Tamparam o tronco e atearam fogo.

Veja também: A história do professor negro e antirracista que ensinou durante a escravidão

Artigo - Mas será o Benedito? - Jornal O Impacto

Seu legado é um rastro de coragem, fé, ousadia e força para lutar , ainda hoje é representado em encenações de Congada e Ticumbi pelo Brasil. Em meio as cinzas encontraram sua pequena imagem de São Benedito. Todo dia 1 De Janeiro, o cortejo de Ticumbi vai buscar a pequena imagem do São Benedito do Córrego das Piabas e levar até a igreja em uma encenação dramática para celebrar a memória de Meia-Légua.

Via história e cultura no mundo

Luiz é doutor e mestre em Memória Social nas áreas de poesia e literatura brasileira e bacharel em Teoria do Teatro pela Unirio - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Em geral, se arrepende do que escreve. Facebook: https://www.facebook.com/profile.php?id=100064740683688 Instagram: http://www.instagram.com/ziul.ribeiro

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sexta-feira, 4 de março de 2022

BEM BRASILIENSE - RENATO MATOS NO CORREIO "Aos 70 anos, artista baiano Renato Matos fala de sua trajetória em Brasília"

 


O artista plástico em plena atividade -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

O artista plástico em plena atividade - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Aos 70 anos, artista baiano Renato Matos fala de sua trajetória em Brasília

Em entrevista ao 'Correio', o artista Renato Matos relembra apaixonamento por Brasília, grandes parcerias e episódios marcantes da carreira

Em meio a batuques, cores e orixás de Salvador, nascia, em 4 de março de 1952, Renato Matos dos Santos. Era para ser uma vida bem baiana para um jovem artista plástico em começo de carreira, quando foi convidado para fazer uma exposição, no início dos anos 1970, na capital do país. "A cidade futurista, e sua arquitetura moderna, remeteu-me a desenhos de Flash Gordon, ou algo como a Bauhaus", destaca Renato, que hoje comemora 70 anos de vida. Ao Correio, o autor do clássico candango Um telefone é muito pouco conta da carreira, das influências e afirma o amor pela arte. "É essa diversidade artística que me sustenta e me faz permanecer vivo e ativo. Cada dia, uma descoberta". Evoé, Renato!

ENTREVISTA / RENATO MATOS

Como era a Brasília que você colocou os olhos pela primeira vez, vindo da Bahia, nos anos 1970?

Eu tinha 22 anos quando desembarquei na Rodoviária do Plano Piloto para fazer uma exposição na cidade. Começava minha carreira de artista plástico e a cidade futurista, e sua arquitetura moderna, remeteu-me a desenhos de Flash Gordon, ou algo como a Bauhaus. Fiquei apaixonado por tudo. Adaptei-me à comunidade artística da cidade, conhecendo figuras como o ator Guilherme Reis, o diretor Hugo Rodas. Minha vida era teatro e música, além da pintura e do entalhe em madeira.

Você é um baiano que misturou suas raízes com o cerrado e criou uma textura nova na música da capital? Esse caldo sonoro começou no Concerto Cabeças?

Foi exatamente no Concerto Cabeças, organizado pelo ator Neio Lúcio que consegui mostrar minha música para um público maior e, também, apresentar meus trabalhos a óleo sobre terra na Galeria Cabeças.

Todo mundo conhece Um telefone é muito pouco, que virou sucesso nacional na voz de Leo Jaime. Como você reage quando alguém pede para você cantá-la? Te incomoda ser visto como artista de uma música só?

Não, porque tenho mais de 300 composições — algumas praticamente inéditas — e disco lançados com boas parcerias, como na música A taba, que fiz com Carlos Cor das Águas, de Salvador, e que foi o primeiro sucesso de Ricardo Chaves no carnaval da Bahia.

"Ah, essa solidão celular. Ter todos ao alcance e não ter com quem falar", versos do seu parceiro TT Catalão que você musicou e se transformou num clássico pós-moderno, pós-tudo. Você é um Tom Zé candango, cuja poética transcende o modismo. Como conviver num país em que a arte é de plástico, de consumo rápido como aqueles cigarros de pen-drive?

Tom Zé, assim como outros grandes influenciadores da cultura brasileira, como Oswald e Mário de Andrade, da Semana de 22, veio do movimento tropicalista, que fez minha cabeça. Meu contato com o mestre suíço Walter Smetak na Bahia e outros músicos também formaram meu universo sonoro.

Você teve muitas chances de ir para a Cidade Maravilhosa, assinar com uma gravadora internacional, ganhar dinheiro e se vender por alguma fama, mas não quis, por quê?

O que é bom, perdura. E quem perde são os "consumidores do imediato", sem o mínimo de autocrítica. Assim também é a falta de bom gosto e de consciência política do país, mas isso fica melhor com o tempo. Talvez pela rebeldia, não me arrependi de nada. Ainda estou vivo, graças à minha criatividade, que me salva todos os dias.

Que lembranças você tem de Renato Russo, de Cássia Eller de seus amigos do Liga Tripa?

As lembranças são as mais positivas com Cássia, gostava do dia a dia com Renato e dos encontros musicais que tínhamos na salinha que usava no Brasília Rádio Center. Quanto ao Liga Tripa, estamos sempre juntos na varanda do Leão da Serra (centro gastronômico e cultural no Taquari). Ultimamente, temos feito uma roda de composição na varanda do lugar, com Sérgio Duboc, Vicente Sá e Fabrizio Morelo... Brevemente, gravaremos algo.

Hoje você tem uma parceria sólida com o poeta Vicente Sá. Com quem mais você queria fazer uma música?

Um bom parceiro é sempre bem-vindo. Recentemente, me encontrei com o poeta Nicolas Behr, comentamos sobre a Rodofernália, uma canção de nossa parceria, combinamos de fazer mais. E você, Zé, quem sabe, poderemos fazer umas músicas juntos...

Antes, a rapper Flora Matos era filha do famoso Renato Matos, hoje é o contrário. Como você vê o crescimento musical de Flora?

Engraçado, mano. Quanto ao crescimento musical e o prestígio de Flora, eu me sinto orgulhoso pelo seu progresso. Às vezes, penso que ela faz parte da continuidade do espírito musical da família.

Em 1989, você gravou o compacto Grande Circular. Em seguida, formou a banda Acarajazz, com músicos da cidade, também lançou o LP Plug, que teve boa repercussão... Era uma época de grande efervescência cultural, teatros lotados, bandas e cantores surgindo. Hoje, temos espaços fechados, uma cena cultural tomada por uma cultura rasteira e sem graça. O que, na sua opinião, pode ser feito para reverter essa situação?

Acho que não reverterá tão cedo e nem o novo normal será tão fácil de adaptação. O velho normal não retornará. Tudo será diferente e será preciso treinamentos na humanidade inteira. Até as formas de consumo, de ouvir e de dançar... De ir a shows também. Estamos vivendo os últimos dias do que se dizia ser normal.

Poucos conhecem a sua grandeza como artista plástico, que fez exposições na cidade. Você é também construtor de instrumentos... Como, ao 70 anos, conciliar tantas atividades?

É essa diversidade que me sustenta e me faz permanecer vivo e ativo. Cada dia, uma descoberta. Quanto à criação de instrumentos, não sou luthier, eu crio esculturas sonoras, descubro sonoridades das superfícies dos objetos, coisa que aprendi com Smetak e Hermeto Pascoal.

https://www.youtube.com/watch?v=gYUiYhdltl4&t=6s

Zirig dum Brasília - Art and Dream of Renato Matos do cineasta André Luiz de Oliveira

José Carlos Vieira
postado em 04/03/2022 06:00 / atualizado em 04/03/2022 09:14