segunda-feira, 5 de dezembro de 2011


Editor Wellington Srbek analisa bom momento do mercado para obras originais e adaptações de clássicos da literatura

Do outro lado do balcão, ele fala sobre seu trabalho à frente do selo Nemo, dedicado às histórias em quadrinhos


Walter Sebastião - EM Cultura
Juarez Rodrigues/EM/D.A Press
O quadrinista Wellington Srbek estuda a fundo sua arte, tendo defendido mestrado e doutorado sobre trabalhos de Ziraldo e Henfil
“Ser editor de histórias em quadrinhos é minha vocação”, afirma Wellington Srbek, mineiro de Belo Horizonte, de 37 anos, premiado autor de histórias em quadrinhos, com mais de 30 títulos publicados desde 1996. A afirmação é resposta a uma provocação: como é estar do outro lado do balcão, já que desde 2010 ele é o editor da Nemo, o primeiro selo de BH dedicado exclusivamente aos quadrinhos. “Não é outro lado, o momento é de outras possibilidades e responsabilidades. Sempre sonhei editar no Brasil artistas que admiro, como Moebius e Hugo Pratt. São clássicos”, afirma, lembrando de artistas conhecidos internacionalmente que ganharam edição de obras inéditas no país. “E continuo a favor dos quadrinhos brasileiros. Vamos apresentar ao público autores brasileiros até agora independentes, de grande talento, que não tinham o espaço que merecem”, avisa. Caminho já iniciado com sete títulos.

Wellington Srbek, um ano depois de assumir a função na Nemo, sem euforia, saboreia a boa repercussão do que já foi realizado – a edição dos autores internacionaischamou a atenção nacional para a editora. “A boa receptividade abre caminhos”, observa. Ele explica que o perfil posto em prática  até agora continua em 2012. Não dá números sobre vendas, mas conta que os álbuns de Moebius foram os mais bem recebidos – ele anuncia mais três álbuns do artista inéditos no Brasil, dois no ano que vem e um em 2013. Será mantido também o namoro com a literatura (já foi lançado Dom Casmurro, adaptação do romance de Machado de Assis) e o investimento em coleções. São elas: Shakespeare (já lançados Romeu e Julieta, Sonho de uma noite de verão, Otelo e, em breve, sai Hamlet) e Mitos recriados em quadrinhos (Ciranda Coraci e O senhor das histórias). Várias delas com roteiros de Srbek em parceria com diversos desenhistas.

O projeto para o selo Nemo, que é um braço da Editora Autêntica, são edições de autores e obras artísticas, buscando excelência gráfica. “Edições bonitas, boas de ler e a preços acessíveis, o que também é proposta nossa”, sintetiza. Fazendo balanço de um ano de atividade, considera que o trabalho de edição de quadrinhos no Brasil vive momento de aprendizado. É há aspectos que precisam ser aprimorados. Autores precisam atuar de modo mais profissional, já que é trabalho que tem estrutura industrial, o que cobra prazos e diretrizes. Com relação às editoras, cobra mais atenção ao que ocorre no circuito independente, “que tem muitos talentos”. A Nemo ainda não tem mecanismo para que os interessados enviem trabalhos para a editora. “Em breve começa a funcionar”, avisa Srbek. 
 
Independente premiado 
 
“Tenho mais de 1 mil páginas de histórias em quadrinhos publicadas”, contabiliza Wellington Srbek, com justa vaidade. Ele atuou de forma independente entre 1996 e 2009, período que lançou 25 trabalhos. Ganhou em 2001, com Estórias gerais, inspirado no sertão mineiro, trabalho em parceria com Flavio Colin – “o mais importante artista dos quadrinhos brasileiros”, garante – o troféu HQ Mix de melhor graphic novel nacional e melhor roteirista; e o Angelo Agostini de melhor roteirista e melhor desenhista.

Característica do trabalho dele, explica, é a presença da cultura brasileira. Em Solar, uma de suas primeiras histórias, fez super-herói andar por BH. Na origem dos poderes do personagem estava força vinda de deuses indígenas. “Acho as coisas do Brasil ricas e é a realidade com a qual estou mais familiarizado. Não consigo ir a Ouro Preto sem voltar pensando numa história em quadrinhos nova”, conta.

O melhor da atividade de autor de HQ, para Wellington Srbek nem é a publicação da história, “mas o momento de criação”. Há aspectos, na atividade, que geram angústias: “Você ter uma boa história e não conseguir editora é frustrante”, conta, lembrando que Estórias Gerais, seu álbum mais premiado, que ganhou edição espanhola, levou três anos até conseguir uma editora no Brasil. Srbek tem mestrado e doutorado, feitos na Faculdade de Educação da UFMG, com dissertação e tese sobre quadrinhos. No mestrado analisou a revista Pererê, de Ziraldo; no doutorado, a obra de Henfil. Autores favoritos do artista e editor: Moebius, Hugo Pratt e Henfil. “São pessoas que inovaram, trouxeram nova estética que enriqueceu os quadrinhos”, justifica.
 
Como você avalia a situação dos quadrinhos no Brasil?
Até os anos 1960, tínhamos muitos quadrinhos brasileiros sendo editados. Com a ditadura militar, a produção diminuiu muito. A situação chegou aos anos 90 sem praticamente nenhuma edição de quadrinhos nacionais – com exceção da Turma da Mônica e das tirinhas de jornais. Atualmente, por outro lado, temos várias editoras investindo na produção brasileira. Mas ainda há muito o que fazer para diversificar e ampliar o mercado. Existe um público ávido por trabalhos novos e de qualidade.

A qualidade das adaptações para quadrinhos de obras literárias no Brasil é satisfatória? 
A adaptação de clássicos da literatura para os quadrinhos é uma tendência forte no mercado hoje. O mérito neste caso é trazer para a linguagem dos quadrinhos textos de alta qualidade. Além disso, as boas adaptações podem quebrar a resistência dos jovens em relação a autores sobre os quais existe o mito de serem difíceis ou chatos. Boas adaptações podem mostrar que esses clássicos são textos gostosos e interessantes de ler.

História em quadrinhos é só para crianças e jovens?
Temos duas imagens equivocadas sobre as histórias em quadrinhos. A primeira é a de que os quadrinhos se restringem aos trabalhos meramente comerciais. A outra é que eles são apenas para crianças, no máximo para jovens. Se observarmos as principais histórias em quadrinhos publicadas no mundo, veremos que não são nem para crianças nem só para jovens. Um álbum de um autor como Moebius, por exemplo, é para estar na sua estante ao lado de seus grandes clássicos da literatura.  

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